terça-feira, 18 de outubro de 2011

HOJE


Pra quem é da opinião de que este blogueiro está se especializando em falar sobre cinema, essa postagem será mais uma evidência. Mas já adverti antes e repito: não assistam filmes apenas porque eu comentei aqui, ou pelo menos não assistam pensando de antemão que o filme é bom, até porque gostos variam e o que me move a escrever em relação a filmes é mais “a partir deles” do que propriamente “sobre” eles.

O filme desta vez é nacional e estava até alguns dias atrás em cartaz: “O Homem do Futuro”. De antemão é bom que seja dito que embora o Wagner Moura seja um excelente ator, um dos melhores da nova safra, sua atuação nem chega perto de outra personagem sua, o genial Taoca de “Deus é Brasileiro”. Já a mocinha (vilã?) do filme, a Alinne Moraes, embora não seja uma grande atriz, ao menos não compromete o filme. O roteiro apresenta vagas semelhanças com “De Volta Para o Futuro”, o melhor filme de viagens no tempo de todos os tempos [redundância proposital]. É quase uma versão tupiniquim do megasucesso americano de 25 anos atrás, mantidas as devidas proporções. Estão presentes as mesmas ideias de que voltar no tempo e fazer mudanças é um risco e que o novo futuro resultado de mudanças no passado pode não ser assim tão bom. Contudo, também está presente a mensagem de que é possível dar “dribles” no tempo em benefício próprio, já que a grande lição que esse gênero de filmes parece pregar, embora fiquem brincando de ir pra frente e pra trás no tempo, é que devemos dar atenção ao “hoje”.















E é justo essa ideia que me chamou atenção no filme, que teve como ponto alto o perfeito casamento do roteiro com a música tema “Tempo Perdido” do saudoso Renato Russo (inclusive coloco aqui um trailer/clipe do filme/música) e que é uma ode ao hoje, ao viver o dia de hoje. Alguns de nós se preocupam demais com o futuro, outros insistem em tornar ao passado, alguns até gastam o seu tempo diário pensando em ambos, passado e futuro, e talvez a grande maioria de nós esqueçamos que a vida é agora, que está acontecendo ao nosso lado, nesse momento, e que “não temos tempo a perder”, que “somos nosso próprio tempo”.

Não estou aqui querendo pregar contra o planejamento e nem mesmo contra a análise do passado, até porque como professor de administração seria incoerência negligenciar tais ferramentas. Elas têm seu valor, tanto na vida quanto nas organizações. Mas quero convidar a todos, inclusive e principalmente a mim mesmo que me reconheço pecador pela falta de atenção crônica ao dia de hoje, a pôr a cabeça para fora da janela nesta “viagem” da vida e olhar o que está acontecendo, porque no dia em que chegarmos ao “destino final”, será tarde demais para admirar, desfrutar e VIVER o “caminho” percorrido. Como diria o professor pouco ortodoxo de A Sociedade dos Poetas Mortos, Carpe Diem, “colha o dia”!

P.S.: muito boa a referência original ao “carpe diem” do poema “Odes” de Horácio que trás a Wikipedia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Carpe_diem

domingo, 9 de outubro de 2011

Lua Minguante


A vida
A vi dali
A vi de longe
A vi da lua
E era ”a” lua,
E a lua era ela
E a lua era dela
E ela era a era da lua
O tempo
O tempo de ser
O tempo de ser tempo
O tempo da lua
A vida era a lua
A lua era o tempo
E o tempo era a vida
E a vida era da lua
O tempo era a lua
O tempo era a vida

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Sobre Ligar Pontos: lições da lua e de Jobs


É curiosa a sensação de já estar sendo observado desde muito antes. De uns tempos pra cá, e já comentei sobre isso no blog, dei de reparar a lua, ou para ser mais exato, passei a conversar com ela. Embora prestar atenção a ela seja recente, descobri que ela já me olhava lá de cima há bem mais tempo. É certo que só agora ela tem a oportunidade de me perguntar o significado de certas coisas e é interessante como ela fica atenta a cada detalhe, como que tentando associar minha fala aos eventos passados. Antes de continuar a escrever, quero apenas esclarecer aos que estão esperando pelas histórias que a lua tem me contado nos últimos meses, sobre as pessoas e fatos que ela observou em sua milenar experiência, que muito certamente terão que esperar um pouco mais por isso, pois acredito que ainda não seja o momento de pô-las no papel. Quem sabe um livro...  Enquanto o “livro” não sai, eu fico por aqui contando um pouco de nossas conversas menos sérias (leia-se, conversas sobre tudo e sobre nada, sobre mim e sobre ela, sobre as relevantes irrelevâncias de cada dia).

Dia desses ela me indagou: “quais  os principais momentos de tua vida nos últimos dez anos?”.   Confesso que a pergunta me deixou meio sem chão, mas a minha cabeça se voltou imediatamente para o ano de 2001. Coincidência ou não, foi um ano bem simbólico em fatos, acontecimentos, além de ser o primeiro ano do novo milênio. E esse pensamento em 2001 foi algo não isolado, pois há pouco, estavam os meios de comunicação noticiando os dez anos do atentado ao WTC.  Lembro que naquele fatídico 11 de setembro, um pouco mais tarde, à noite, eu recebi minha primeira homenagem como professor de uma turma em que dei aula. E eu não era nem professor efetivo e nem mesmo substituto, apenas um voluntário aluno do mestrado em Administração, mestrado do qual, por razões que não vem aqui ao caso, havia sido “desligado” (foi essa a palavra que utilizaram na carta que me mandaram após terem negado meu pedido de prorrogação) poucos dias antes da homenagem. Foi dolorido participar das cerimônias de formatura e ser perguntado sobre o mestrado e ter que admitir que tinha sido “desligado”. O eficiente “robô”, que desde criança até concluir o curso superior nunca havia reprovado uma única disciplina sequer, que estudava com alunos em média dois anos mais velhos, que passou no primeiro vestibular que fez, que chegou a dar aulas para quem havia ingressado na universidade por este mesmo vestibular que ele, que à época foi o mais novo  mestrando do programa ao qual estava vinculado, este mesmo “robô” por não “funcionar” adequadamente naquele momento foi “desligado”. E foi exatamente essa a sensação que me acometeu naquele final de inverno e início de primavera de 10 anos atrás.
 
Quando a lua me perguntou sobre esse período de tempo, a rápida retrospectiva que fiz me deu a entender que pouco adiantou os tantos planos feitos, aquela quase que obsessiva tendência a pensar no futuro, até porque o mundo mudou muito nos últimos 10 anos e o que realmente me ajudou a chegar aos dias de hoje foram os momentos em que vivi com mais intensidade o “hoje”, aquele “hoje”, hoje passado, porém presente na memória do “hoje” de hoje. Isso eu só percebi porque a pergunta dela me levou a isso, e como ela já me observava desde antes, eu até acredito que a pergunta não tenha sido ao acaso. Conhecendo-a mais agora, imagino que tenha sido muito mais um artifício pedagógico para promover em mim uma auto-reflexão do que apenas a pura curiosidade de uma lua questionadora.

Nesta semana os noticiários apresentam a morte de um dos homens mais criativos que a história recente produziu: Steve Jobs. Co-fundador da Apple, ele revolucionou o mundo da informação e tornou esses últimos dez anos ainda mais intensos.  Mês passado, quando ele se afastou da Apple pela doença que o levaria à morte, assisti um vídeo no qual ele faz um discurso a uma turma de formandos da Stanford, e onde contava três histórias: a segunda, sobre sua demissão da Apple; a terceira, sobre a morte; e deixei para falar da primeira ao final, porque é dela que quero continuar a refletir: “sobre ligar pontos”.

Jobs argumenta que os pontos soltos só fazem sentido quando olhamos para trás. No caso dele, ter sido dado para doação e ter sido recusado pelo primeiro casal que deveria adotá-lo porque queriam uma menina, só fez sentido mais na frente, quando o novo casal de pais adotivos começou a gastar todas as suas economias para dar ao filho [ele] uma formação superior.  Ao perceber isso e, mais ainda, ao perceber que não gostava do que o estavam ensinando, abandonou o curso e com o tempo que passou a dispor, pôs-se a assistir as aulas que gostaria de ter, ainda que de forma “oficiosa”, tais como: caligrafia. Aparentemente seria um ponto bem solto, não fosse o fato de que, dez anos mais tarde, as noções de tipografia que aprendeu naquelas, aparentemente, insignificantes aulas, dariam um salto qualitativo sem precedentes nos editores de textos pós-macintosh. No discurso Jobs pede que acreditemos que os pontos de hoje serão ligados amanhã se fizermos o “hoje” com o coração. De uma forma ou de outra, embora a morte pareça sempre nos dizer o contrário, os pontos soltos da vida de Jobs foram todos ligados essa semana, e se acaso não parecem ligados, é porque os pontos soltos da vida de uns se confundem com os pontos soltos da vida de outros.

A lua, que estava ainda mais atenta aos meus pensamentos e palavras, meus atos e omissões, me pediu em sua lunática sabedoria que aprendesse a viver um dia de cada vez, sem despedidas e sem promessas, fazendo de cada dia o melhor dia possível, dando o melhor de mim: o melhor abraço possível para o momento, o melhor sorriso possível para a situação, o melhor olhar possível para a circunstância, a melhor palavra possível para a ocasião. Ao mesmo tempo em que é empolgante descobrir-se a cada dia um aprendiz, confesso que tem sido uma lição difícil de aprender. É complicado rever conceitos, opiniões, valores e crenças. Mais complicando ainda é questioná-los. E muito mais complexo é perceber que alguns deles fazem pouco sentido de agora em diante, embora tenham sido extremamente úteis para se chegar até aqui. Acontece que não é possível carregar tudo e sempre. Como na bela declaração ao amor de São Paulo aos Coríntios, para cada fase da vida precisamos nos ver de formas diferentes. O que foi adequado antes talvez não seja depois e nem por isso perde seu valor, pois fica guardado na memória, local onde os momentos são eternos. Somos sim uma soma de nosso passado, mas somos mais ainda aquilo que queiramos ser. Para isso, por vezes, é preciso, além de somar, subtrair, dividir e certamente multiplicar.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

São Francisco* para Professor


Por que temos que ler e escrever sobre o que não queremos e deixar de lado aquilo que gostaríamos de ler e de escrever? Agora mesmo estou diante de vários textos que devem ser lidos nos próximos dias para o doutorado e nenhum deles me é realmente atraente, embora até acredite que alguns (certamente não todos) possam ser úteis (um dia...). De certo, apenas que a obrigatoriedade em lê-los já me é um grande estímulo à não leitura. Meus melhores professores não só foram aqueles que eram apaixonados pelos temas que discorriam, mas sobretudo , os que assim, apaixonados, nos deixavam enamorados. E assim, apaixonados também nós, devorávamos tudo aquilo que nos era apresentado sobre o objeto da, agora, "nossa" paixão. O professor não deveria ser aquele que "passa" textos para serem lidos, mas aquele que assume pra si a função de cupido entre o aluno e o conhecimento.

Mesmo com tantos textos "obrigatórios" para serem lidos, resolvi me apaixonar assim meio que do nada, por um livro de filosofia, onde a autora defende que "o foco define a sorte".  Como todo apaixonado, mudo as minhas prioridades e arranjo tempo para inserir nesse mesmo pouco tempo, um tempo para minha recente paixão. A autora defende que a razão de muitos dos problemas nossos de cada dia são decorrentes de sermos levados a adotar o paradigma da escassez. Nele aprendemos que não há o suficiente para todos, então assim, acabamos por pensar primeiro em nós (egoísmo), a acreditar que é preciso haver perdedores e ganhadores (competição) e que é necessário  guardar porque de certo um dia irá faltar (acúmulo).  Não precisa ir longe para descobrir que esse é um modelo que privilegia poucos e exclui muitos. Em contraposição, a autora defende a adoção de um paradigma diferente baseado na abundância. Se imaginamos que há o suficiente para todos, então podemos contribuir com os outros (altruísmo), agir de modo a que todos ganhem (cooperação) e dividir os recursos de forma comunitária (partilha). Talvez isso realmente se aproxime do ideal de desenvolvimento sustentável, que tanto apregoam em discursos, mas pouco fazem em ações.

E pensando em termos de altruísmo, cooperação e partilha, o dia de hoje me trás à memória um jovem italiano, de nome Francisco, que viveu  na cidadezinha de Assis, em tempos passados, que em nome da visão da abundante graça reservada por Deus a todos os homens e mulheres , renuncia a tudo, ou melhor, renuncia ao que nos torna um nada. Abandona o status, o conforto e a riqueza da escassez e se veste do status de irmão do sol e da lua, do conforto da brisa e da sombra,  e da riqueza do viver em harmonia com todas as criaturas do universo. Algo me diz que Francisco teria sido um excelente professor universitário, pois teria feito seus alunos se apaixonarem pelo irmão conhecimento e pela irmã sabedoria.  São Francisco de Assis, rogai por nós!


(*) Hoje, 04 de outubro é o dia dedicado a São Francisco de Assis