Esse segundo conto da lua, o
primeiro dentro da promessa de que um novo conto seria postado a cada noite de
lua cheia, quase não sai na data prevista. Acordei no meio da madrugada e me
lembrei que da janela próxima ao meu computador, em determinada altura da noite,
é possível ver a lua. Dito e feito, lá
estava ela, linda e maravilhosa. Uma noite de algumas nuvens, mas daquelas que
apenas de vez em quando encobrem a lua dando-lhe um aspecto enigmático,
silencioso, reflexivo.
Sentei-me no chão, próximo à janela,
e fiquei ali admirando-a. Ela sem falar nada, parecia gostar de ser vista em
sua completude. Não sei por quanto tempo permaneci no mesmo local, quase
imóvel. Foi quando me dei conta que precisava cumprir a promessa dos contos. Só
não sabia como e qual, pois foram tantas as histórias e tão belas que merecem
ser todas contadas, porém não de qualquer forma, já que são histórias, de todos
os tipos, das mais simples às mais inacreditáveis. Precisava de inspiração. Aí,
me dei conta, que desde o dia, enfim, que eu olhei (mesmo, de verdade) a lua
pela primeira vez, se eu fosse contar a passagem do tempo como os povos
primitivos, diria que haviam se passado doze luas desde então.
Mesmo essa história do meu
encontro com a lua já ter sido descrita em grande parte na postagem primeira
sobre a lua ("Mundo da Lua") alguns fatos anteriores e posteriores podem ser ditos
também, de modo que resolvi que o segundo conto da lua seria justo sobre mim e
sobre a lua, ou ao menos sobre um pouco de mim e sobre um pouco da lua.
Lembro, como fato anterior,
que o nosso encontro foi preparado com antecedência. Eu, como já confessei
antes, nunca fui de observar a natureza e a lua nela se incluía. Mas numa noite
de julho, eu no sítio de minhas tias no interior de Alagoas, com uma dessas
insônias que me é tão comum, com todos tendo dormido muito cedo conforme
costume da região, sem ter o que fazer, um tanto quanto entediado, resolvo
ficar na cama tentando acessar pelo celular o facebook para ver se conseguia
alguma distração para a noite que prometia ser longa. O sinal para variar era
péssimo, mas de vez em quando dava um “traço” de cobertura no mostrador do
celular e eu conseguia ler ou enviar um inbox,
sempre demorando muito entre um e outro. Tentando explicar meu tédio, típico de
viciado em tecnologias da modernidade, me disseram com sutileza: “tenta olhar a
lua! Dizem que nesses locais ela fica ainda mais linda”. Confesso que o
comentário mexeu comigo em algum lugar, mas o meu racionalismo típico tratou de
abafar a mudança que já começava a se proceder dentro de mim, uma revolução
silenciosa forjada ao longo dos anos a qual eu não atentava muito, apenas
preocupado com o lado “sério e responsável” da vida. Mas aquelas palavras foram
como sementes do evangelho que caíram em terra boa e acabaram por germinar no
dia em que, sorrateira, a lua apareceu diante de mim em todo o seu esplendor,
sorrindo de minha cara estupefata por nunca antes tê-la percebido assim. Ela
disse que durou o tempo que foi necessário para que a plantinha começasse a
nascer e que dali para frente nós dois passaríamos a ter uma relação muito mais
próxima, de companheirismo, de cumplicidade até. Eu contaria minhas alegrias e
tristezas, minhas histórias repetidas e aquelas que até então permaneciam em
segredo, meus medos e minhas realizações, e ela, em troca me contaria histórias
das pessoas que ela observou lá do alto durante todos esses anos.
Como fato posterior, que fica
claro nas postagens ao longo dessas doze luas, não houve uma única noite onde
eu não a procurasse no céu, em cada uma de suas fases, de seus momentos.
Algumas vezes a sua posição em relação ao sol ou o tempo ruim não me permitiam
vê-la, mas sempre havia a certeza que ela ali estava e que me ouvia e me
ajudava a ser uma pessoa melhor. Incrível como observar coisas tão simples como
o luar podem nos ajudar a ficar mais próximos de Deus. Lembro nesse instante de
um livro de meu escritor preferido, o Rubem Alves, cujo sugestivo título é “O
Amor que Acende a Lua”. Livro de crônicas, organizadas em sessões nomeadas com
as fases da lua: nova, crescente, cheia e minguante. Numa das crônicas ele
defende a necessidade de aulas de “escutatória” ou invés das aulas de oratória.
Ele faz uma bela defesa da arte do ouvir, e a certa altura parafraseia um poeta
dizendo: “não é bastante ter ouvidos para se ouvir o que é dito. É preciso
também que haja silêncio dentro da alma”. Sempre falei demais e ouvi de menos,
percebi isso com a lua. Antes dela eu, de forma até um pouco arrogante, achava que
era um bom ouvinte. Não era! Ela me mostrou que para ouvir de verdade é preciso
paciência, contemplação, silêncio. Desde então tenho feito um esforço para
ouvir de verdade e nesse exercício tenho percebido porque ela, a lua, sempre
tão silenciosa, tem tantas histórias por contar, porque ela sabe ouvir as
tantas pessoas que a ela recorrem todas as noites.
Paro um pouco de escrever e me
volto para a janela de onde posso vê-la e surpreendentemente não há mais
nenhuma nuvem a encobri-la. Ela nada fala dessa vez. Em sua escuta silenciosa
deve estar oferecendo sua luz, tomada emprestada do sol, para clarear a vida de
tantos de nós que nos encontramos no escuro, depois de dias difíceis onde tudo parece
não ter solução. Ela parece querer, com seu brilho estonteante, nos ensinar que
também somos luz, que também podemos espalhar essa luz, que ao iluminar o
caminho dos outros estamos, também nós, iluminando um pouco o nosso próprio
caminho.
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