sábado, 18 de agosto de 2012

SEM SENTIDOS


Já faz algum tempo que não escrevo a partir de filmes. Houve um período até que acharam que eu estava tentando tornar-me alguma espécie de crítico de cinema. Como expliquei, essa nunca foi a intenção. E continua não sendo, mesmo porque dessa vez comento a partir de um filme que abandonei pela metade e não sei nem mesmo como termina e foi justo pela angústia provocada pela perspectiva do final do filme que me fez desistir de assisti-lo todo. É bem provável que em outra oportunidade eu veja o filme completo, mas há dias em que não se está bem e isso acaba catalisando sentimentos como a angústia da temática evocada pelo filme. Contudo, o enredo não deixa de despertar reflexões posteriores e esse blog acaba sendo, como sempre, vítima desses pensamentos.

O filme, uma produção conjunta alemã, britânica, suíça  e dinamarquesa, de título original perfect sense, em português nomeado como "Sentidos do Amor", coloca um casal como pano de fundo de uma pandemia que assola a humanidade, onde um a um os sentidos, olfato, paladar, audição, visão e tato, vão sendo perdidos. Lembrem-se que não assisti tudo, mas o que importa aqui é pensar como seria uma vida sem sentidos. Na verdade, o que dá sentido a vida são justo os sentidos. São eles que fazem com que pessoas e fatos, parafraseando Milan Kundera, se inscrevam em nossa memória poética.

Acredito que o filme me deixou assim tão angustiado porque desde criança a ideia de perda de algum sentido sempre me assustou. Já adulto passei a encarar o fato de que estou perdendo o sentido da audição de um dos ouvidos. Imaginar perder todos os sentidos então, acaba potencializando esse medo. Mas dizem que uma das formas de enfrentar os medos é falar sobre eles. Talvez por isso esteja aqui nesta madrugada escrevendo esta postagem.

Sem o olfato, não teríamos memórias das mais marcantes. Pelas narinas nos vem o ar puro, ainda que engarrafado e também a fragrância única formada pelo contato do perfume utilizado com a pele da pessoa que se ama. As pétalas de rosas não se entranhariam tanto em nossa alma e o  cheiro do mato agreste após a chuva não deixaria tantas lembranças.

Sem o paladar, perde-se grande parte do sabor da própria vida, como o gosto de morangos com chocolate e vinho ou mesmo sushis comidos com indiscreta e bem humorada displicência. O sabor de um beijo diferente de todos os outros só é possível porque o cérebro consegue interpretar maravilhosamente o que nos quer comunicar nossas papilas gustativas.

Sem a audição... (arrepios me invadem). Sem a audição, o som daquela voz que não se esquece e não se quer esquecer nunca, não transformaria tanto os nossos dias. E o que dizer das músicas que fazem parte de nossa história e que nos transportam para momentos que ficaram eternizados?

Sem a visão não seria possível perceber que o mundo fica ainda mais colorido quando se sente uma emoção que nunca se experimentou antes. Sem a visão o rosto da pessoa amada e de pessoas queridas não fariam parte de nossa memória. O que dizer daquelas fotografias, com efeitos especiais ou não, que podem ser expostas nas paredes do quarto lembrando a felicidade vivida? Memória fotográfica literalmente... Mais sobre a fotografia...? Bem, disso já falei em postagem anterior...

Sem o tato, sem o contato, sem o abraço, sem o toque, sem a pele, sem a textura, sem o calor da água quente do chuveiro, sem o frio que pede agasalho e aquecimento, sem sentido...

Peço que não julguem o texto, ao menos dessa vez. Apenas aceitem-no, se possível, assim como está escrito. Sei que cada um pode dar sua própria interpretação e que o texto uma vez escrito não mais pertence ao autor, mas imaginem que é apenas um texto de alguém que tem medo e que está buscando formas de vencer esse medo, como que numa terapia, onde a fala é o meio de cura. Já escrevi textos com o objetivo de polemizar, de contrariar, até mesmo de agredir, mas esse é apenas para buscar um pouco de uma sincronicidade entre escritor e leitor, não para satisfação do ego, mas pela felicidade que se tem quando se lê o que se pensa e quando se escuta (audição de novo) que o que se escreve é exatamente aquilo que o outro pensa. Aquelas coisas que dão, enfim, sentido a vida...

Um comentário:

Deixe seu comentário, sua sugestão, sua crítica!